segunda-feira, 30 de junho de 2008

Olhos

''A consciência moral, que tantos insensatos têm ofendido e muitos mais renegado, é coisa que existe e existiu sempre, não foi invenção dos filósofos do Quaternário, quando a alma mal passava ainda de um projecto confuso.
Com o andar dos tempos, mais as actividades da convivência e as trocas gentéticas, acabámos por meter a consciência na cor dos sangue e no sal das lágrimas, e, como se tanto fosse pouco, fizemos dos olhos uma espécie de espelhos virados para dentro, com o resultado, muitas vezes, de mostrarem eles sem reserva o que estávamos tratando de negar com a boca.''
José Saramago - Ensaio Sobre a Cegueira

(a todos)

Não é nas tuas palavras insensatas e incoerentes que vou te definir ou me perder, me enganar ou sorrir. E sim nas coisas que eu vejo...que vejo de olhos fechados.
Cultuemos o silêncio dos olhares e dos movimentos involuntários, impensados e das irracionalidades que vêm do âmago do seu desejo omitido.
Na qual abafas teus ouvidos para as viciadas palavras venenosas e réplicas mentirosas de comportamentos generalizados.
Tu tens a beleza da singularidade quando calas! Então cala-te e ouça o som da minha respiração, leia minha vontade nos meus lábios e minha tensão em meus pulsos...e saberás quem sou, mesmo que eu diga mil palavras. E eu saberei quem tu és vendo o que não falas...
Cala-te, descanse suas vozes.São inúmeras!
Olha com seus solhos semi-cegos para teu ser bruto e começe a delinea-lo.
Diga-me com um toque em meu pescoço sua vontade.
E eu entenderei...
Saberei se condiz com a minha.
Sem te falares.
Sem me falar.

O Silêncio é o dialeto mais íntegro.
O Sutil é a beleza mais singela.

Então tu, vós, todos entenderão a profundeza do meu olhar.Que te desdobra, que te desmonta, que enxerga cada parte do teu espelho quebrado em tu.

Assim, digo...nunca haverei de ser cega! Talvez sim, um dia, muda.

Liege

domingo, 29 de junho de 2008

Cores Proibidas


Eu vejo pelas rugas dos seus olhos, garota, que você sorri com sinceridade.
Vejo pelos seus cabelos bagunçados sua inquietude e sei que na sua mente passam idéias a jato...
Você morde o lábio inferior e olha pra cima.
Eu sei como você olha.Eu seu quando você está bem.

Você fala rápido, fala muito, fala sobre tudo, você ri alto.
Arregala seus olhos grandes e castanhos, morde os dedos de leve.

Sinto quando você está prestes a voar de leveza...
E como fica bela sorrindo e falando como uma criança velha demais.
Eu fito seus olhos, você os meus...por minutos seguidos.Eu pego na sua mão áspera e nas suas unhas mal feitas...e você me dá balas de maçã.

Fico pensando como você é com as outras pessoas e seus outros amantes, principalmente os que não sejam utópicos.

Digo que você tem o mundo nas mãos, que és perfeita, mais perfeita do que tudo que já vi...
Digo para cuidar dos seus altos e baixos, menina!
Suas asas se quebram e você chega lá com a cabeça baixa,
quantas vezes te vi morta.

E você renasce assim, algumas semanas depois.Como se fosse imortal.
O mundo faz como aquela história do pássaro colorido demais...
Eles te bicam até a morte!
Eu fico com medo de vc ser bicada ate a morte.

E você tem uma coragem tão cega.
Se joga, abre as asas coloridas e enfrenta o mundo de cara.
É tão belo, e você cai sangrando depois...e volta pra sua casinha.
Eu sempre acho que você aprendeu, mas não! Tu queres mudar o mundo!!
Te chamo de arrogante, mas seu olhar é tão gentil, penetrante, inocente.
Então você coloca uma dúvida em mim.

E além desta, tem outra...de onde vem tanta coragem?

Acho que o que te falta é amor, menina.
Você não ama, seu coraçãozinho é seco.
Você não deixa os outros entrarem...
Você não ama.
Você não é amada, só por mim...só por mim.Em segredo...a distância, platonicamente.


*

Eu...digo que não sei viver sem mostrar quem sou.
Não sei a arte de esconder nada.
Sei outras artes.


Não sei amar...dizem que amar é dar, eu dei tudo de mim...
Que não tenho muita coisa mais.Eu sou vazia. Inferrujada e seca.
Você não viu a confiança que me falta, no mundo, nas pessoas, em mim...
Eu só confio nas minhas palavras que são tão inúteis para quem quero que as ouça.
Sim, tenho medo que entrem dentro de mim e estraguem o resto que sobrou.
E me fecho a mil chaves, por medo. Que coragem você vê aqui?

Eu vou descrendo,
cada dia...
perdendo...
Sumindo...

Nada me faz acreditar, pouco me faz sonhar.
Tiro tudo que tenho de mim.
Vocês não me dão nada, obrigada!

Sim, sou ingrata.
Hoje, nesse momento vou ser ingrata.
Só por mero capricho...

Assim, sem vocês de fato perto de mim, sem as pessoas que preciso...sem o mínimo que preciso de vocês quando estou n chão, eu vou rompendo esses elos humanos. Ficando mais livre.

Dai vocês me olham e eu estou jogada as traças, decadente...e desprezam minha decadência, e ficam com dó de mim. Poucos sabem...que alí no chão eu choro e engulo minhas próprias lágrimas, e levanto, quando levanto é um estrondo...você vê minha grandeza e infinitude...meu olhar desprendido...e se olhar melhor, pode observar que meus pés cada vez tocam menos o chão...e que eu estou começando a voar, e a não fazer mais parte...e chegar a um lugar que ninguém me machuque, que eu possa dançar.

Trágico?
É.

O que eu queria é não precisar disso.
Imagino alguém levantando meu rosto e limpando minhas lágrimas.
E me colocando de pé...como nunca acnteceu.
E contrariando o que o outro disse acima, que minhas cores não vão ser repudiadas.

Amo sim, amo minhas cores. Cada uma delas...e meus detalhes.
E minha dualidade, meu ser paradoxal, antitético.

Que sabe fazer qualquer pessoa ir das lágrimas ao sorriso.
Do pesar a leveza.
Do fundo do mar aos céus.

Eu sei.
Eu posso.
Eu sou.
Eu faço.


Temos vagas para pessoas interessadas.
Covardes, passem longe...ou deixem sua covardia na caixa alí a esquerda perto da porta.
Se perguntarem onde está meu coração, te mando ver o Mágico de Oz.


Então eu te entrego uma venda, te dou uma bocicleta e te empurro do morro...
Você cai no chão la embaixo todo arrebentado.
Daí eu falo:
'' Hora de se reconstruir!''

É assim que começa meu mundo de utopia.
é nesses devaneios que encontro alegria.
De ensinar alguém a voar um pouco.

Como pipas...um dia colorir o céu.
Com estas cores, lindas,
proibidas.



Liege

Não ouse falar



Não ouse falar.
Nem brinque de sentir.
Desligue o fio que te liga a qualquer coisa.
Nem respire, por favor.
Acalme-se...
Deixe que te abatam.
Ajoelhe-se e mostre o pescoço.Deixe que cortem.
Deixe que pintem seu rosto.
E digam a roupa que deve vestir.

Faça.

A cara de indiferença.

Acostume-se com a inação.

Não se mova, por favor...
Não procure, não ande...não olhe.
Acima de tudo! Não veja...por favor...não veja mais.

Não escute...

Fale pouco.
Se for necessário arranque seus olhos.

Te ensinei que as palavras são demasiadamente desnecessárias.
É assim que ouço tudo, coloco pedras nos bolsos do meu vestido listrado e entro levemente pelas ondas do mar...

E acordo em outro quarto.
Cada dia em um quarto diferente.


Sei prever as coisas pelos sonhos.
Basta saber que dizem o contrário...
E sei que pessoas são sonhos.

Por isso quero acordar.
Dessa vez não em um quarto...
E sim no lugar que entro.
Naquele mesmo mar.

O Sol não me busca mais.
A lua já morreu...vejo seu cadáver iluminado todas as noites.
É só o que consigo ver.
Pois as coisas divinas cegam meus olhos.

Parece que nenhuma verdade mais me abala.
Conquistei a inação.

Só falta destruir a vida.

.

Lembre-se, vão repudiar tua verdade.





.

PS: Tive um péssimo sonho hoje...

sexta-feira, 27 de junho de 2008

A Máquina




Todos seres humanos são uma grande máquina com engrenagens e uma lógica ilógica que se fora de eixo destrói tudo e a si mesma.

Vou te falar sobre uma máquina bem estranha já criada, modelo único, que precisou de um manual de instruções...para compensar sua exentricidade implicita.

Ela possui um sistema de auto-proteção tão forte que bloqueia tudo, todo seu fluxo natural e belo...surgem grades em seus olhos e seu coração automaticamente começa entrar em ritmo de silêncio. A máquina diz '' Não me diga o que não posso fazer'', ela acha que realmente pode mudar o mundo, iluminar as pessoas e curar chagas com suas lágrimas de riso.

Mas não há quem cure as chagas dela...eu diria grandes, talvez se ela resolvesse mostrar seu coração a alguém seria uma cena de horror e homicídio, tantas cicatrizes e facas enfiadas e machucados que ela carrega de cabeça erguida e sem medo de se ferir novamente.
Talvez se ela abrisse as costelas e mostrasse o que ela carrega as outras mpaquinas teriam vergonha de suas cicatrizes.

Mas ela sempre proucura e proucura...
Procura alguém que com ela não tenha medo de se arriscar, de se machucar...de viver algo sublime...ela não é como qualquer outra máquina.
Ela está cansada de pessoas com medo demais...está cansada de ensinar as pessoas a voarem , todo mundo tem medo de altura...ninguém quer se arriscar e se soltar e viver sem limites e sem medo.

Ela vive num mundo de traumas...todos com seus traumas. E ela com os seus.
Ela se pergunta: porque eu simplismente não deixo meus traumas conduzirem minhas ações e as outras máquinas deixam os traumas determinarem seus atos?

Não adianta, ninguém ouve, ninguém permite...você vai ver, se observar...quantas vezes ela tentou desbloquear traumas, dar um pouco de alívio , sorrisos em caixas de presente...asas e liberdade.Quantos discursos ela fez para ouvidos bloqueados. Um dois, três, quatro...
Muitos.
Então ela se lembra que não adianta falar.
Então ela para de falar.

Então ela lembra que tem vontades e sonhos, e que fizeram-na prometer não mata-los novamente pelas outras máquinas cegas e apegadas a passados e a traumas, a limites...
Ela então resolve voar para seu lugar isolado...para onde ela sempre acaba voltando quando sente a intransigência do resto das máquinas...quando se sente repudiada, quando alguém coloca limite nas suas possibilidades...
Quando ela se abate porque só encontra pessoas com placas no pescoço escrito '' não passe daqui''.
Ela olha pra baixo, vira as costas e vai embora.
Ela já conheceu o motivo de todos...mas ela diz , vocês têm noção dos meus motivos?
Mas o mundo é demasiadamente egocêntrico para que alguém olhe para o lado sequer.
Ninguém olha para possibilidades em potencial e simplesmente tira as correntes e realmente deixa algo fluir.
Na verdade ninguém deixa nada fluir.

A Máquina então, quando é surpreendida nessa situação se arma como um guerreiro, pronto para ouvir aquelas mesmas palavras. Se arma contra a guerra de palavras que não têm nada a ver com a vontade e sim com convenções e traumas.A vontade geralmente é sufocada em nome do passado( a vontade não deveria ser o mais importante? )...todas as pessoas que vi são assim.Não vêm um futuro, ou se quer tentam TENTAR algo diferente. Elas se estagnam no medo achando que é um lugar agradável e seguro...entram numa bolha e só deixam que pequenas coisas entrem e pequenas coisas saiam,
se isolam em ilhas vazias cujo rei é ele mesmo de um exército feito de medo e apreensão.
Pre-ocupação.
Bobagem.

Eu sai da minha ilha, da minha bolha, na merda que vivi...todos os traumas que tenho eu os deixo de lado para tentar qualquer coisa...minha vida boa, eu sempre arrisco uma melhor.
Eu sempre procuro algo melhor e melhor.
Mas estou no mundo errado com as pessoas erradas, ninguém quer arriscar ou voar...ninguém quer se curar, ninguém quer viver algo novo.Todos querem uma vida segura, querem lamentar seus traumas em silêncio durante a noite quando alguém está alí na porta oferecendo o calor do dia e a magnitude dos céus...a leveza das coisas livres.
Oras...o céu está absolutamente vazio!

Uma máquina com asas...quem diria.
Que fala uma lingua que ninguém ouve.
Que quer libertar quem adora viver preso.

Eu não, olho para o abismo, e sorrio diante do fundo do poço...me jogo e digo '' não importa, eu sei voar''.

E vocês?
Se recolhem catando os pedacinhos dos seus traumas e mentindo para si mesmos dizendo que a vida é boa do jeito que ela está.Enchendo seus caminhos de placas de ''pare''.E as oportunidades de uma possível vida melhor passando, vocês ignorando e dizendo '' ah não, agora não posso''...e elas vão embora uma hora.
A vida não espera as máquinas.Por isso elas inferrujam.

A Máquina agora armou-se para defesa.
Ela mergulhou nas lembranças de seu passado.
Lembrou das suas vontades íntimas...
E algo em seu peito resolveu entrar em pânico, porque ela não quer ser bloqueada.
Limites, bloqueios, placas...ela abomida.
E então perde-se a fluidez de seus atos...
Afinal...quando algo parece que vai se repetir...não tem como não se decepcionar.

Ela só espera o dia que outra máquina a surpreenda.
Sem tempo, sem data.

Infelizmente quando ela arma seu sistema de defesa.
O tempo começa a contar.

Como desarma o meu sistema de defesa?
Desarmando o seu.


.

O que me decepciona na vida são as pessoas com medo de tentar.
As pessoas que colocam muros nos caminhos nos quais as pessoas querem um dia passar.
O que me chateia é que isso aconteceu comigo várias vezes, várias vezes eu ouvi a mesma história...de que cada um quer tempo pra si.Como se eu fosse tomar o tempo, tomar algo de alguem.A felicidade existe independente de qualquer coisa...a liberdade também.


.
Liege

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Pétalas


Dos tempos rudes e cruéis guardos marcas fundas em minha casca.
Me perguntam de onde vem o que sinto e o que sou.
Eu, refletindo sobre a linha que costura as coisas...acabo costurando minha pele e meus dedos.
Perdendo-me nas cordas rígidas e nas montanhas íngremes dos meus sonhos inalcançáveis.
Perdendo gotas de sobrevivência...e secando, morrendo aos poucos ao chorar minhas palavras sobre um belo mundo que quero construir...chorar as angústias do belo mundo que quero destruir.

Eu sem te dizer vou te contando.
Sobre um caminho sem marcas no chão.
Nem placas
Para que você vá apenas voando...
Pelos mundo das idéias que não podem ser ditas.

Derramei todas minhas angústias e palavras amarguradas
Coloquei minha ira nas coisas delicadas
Amarguras e fel, dei dizendo que são águas...enquanto você sofre na cruz.
Eu fui capaz de cortar seu coração com a lança da verdade.

Paradoxalmente também trouxe aquele pouco de luz
Mostrei que as águas sustentam meu peso com suavidade.
Que que posso reviver as coisas mortas.

Mostrei todo o azedume do meu peito.
Todo o pecado do meu leito.
As injúrias que guardei.
Os sonhos que matei.
As vezes que suicidei.

Todo fundo de poço que encontrei.
Toda desgraça que busquei.

Somente para descobrir
A velocidade que cheguei, a força que subi...os ventos que cortei.Os olhos que atravessei...todas as perguntas que fiz.As virtudes que conquistei.
Das batalhas que não recuei, dos estardartes que ergui.
Das vitórias que perdi...para não pisar nos corpos vivos jogados nos campos de batalha.

Tenho que te contar,
também!
Sobre as minhas doenças que não curei.
Sobre o deserto na qual caminhei.
Dos ossos meus jogados que encontrei.
Do meu esqueleto, que sozinha, montei.
Da morte que enfrentei.
Do medo que recusei.

Queria te falar sobre
As facadas que tomei...
das vezes que voei, do tanto que renasci.
Das histórias alegres que vivi.
Dos desejos, dos sonhos, dos medos, dos segredos.

Do pássaro que sou
Da leveza do meu corpo
da amplitude do meu vôo
Da paixão dos meus atos
Da alegria implícita em cada fato
Das cores proibidas das minhas penas
De que toda tristeza em mim é apenas ilusão.

Dou isso tudo...isso tudo que sou eu.

Você então entenderia porque vejo a beleza dos pássaros que voam embaixo do chão.
Das árvores que florecem uma vez ao ano.
Das rosas e seus espinhos.
Da liberdade que há dentro das coisas que esvaziam-se poraí.
Que a indiferença é a única prisão.





Dessas palavras desconexas que você não entende.
Não entende porque são muito densas, na qual estou colocando tudo na minha vida,
para dar um momento a você...dar esse momento meu, que eu queria que você sentisse...porque ele vai passar, vai voar...

Por esses momentos eu faço tudo.
E são eles que me levantam.
Eu adoeço tanto...quando me fecho.


E tenho que fazer todo esforço para lembrar daquele caminho que te falei.
O das coisas leves.
Abrindo-se para o mundo sem medo de que as coisas entrem.



E deixando que tudo se vá...




[Dai-me um momento teu]

Liege.




.
Motivo da Rosa


Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.

(Cecília Meireles)